sábado, 22 de março de 2008

Algodão-doce

Não me importavam as idiossincrasias da mulher do algodão doce.

Estudos concluídos até à quarta série do ensino fundamental. Um filho aos dezessete, outro aos dezenove e depois ainda mais outro, aos vinte e cinco. Solteira, abandonada pelo marido que fugiu com o dinheiro e o cachorro. Dinheiro juntado, amassado e preso com elástico debaixo do colchão, aumentado a cada mês, até que pôde comprar uma máquina de algodão doce.

A máquina: linda, vultosa, prateada de doer os olhos. O açúcar cristalino virava fios, que se enroscavam no espeto de churrasquinho como em um carretel. E o troço ia tomando forma, a anilina ia dando cor, a embalagem plástica ia deixando aquilo tudo protegido e impermeável e as bolinhas de encher coloridas iam sendo coladas com durex a cada vez. E todos eles iam sendo espetados numa espécie de toco central, a estrutura que, segurada por baixo pelo vendedor, permitia a exposição e o comércio.

Pro Carnaval ela fez o triplo que de costume: trezentos. E o toco central ficara, assim, do dobro da altura costumeira. E o conjunto toco-algodões-doces ficou denso, vistoso, corpulento. E, com pouquíssimos algodões-doces ainda vendidos, ela teve o azar de me encontrar.

Eu passei por ela e pedi para comprar um algodão-doce. “Me vê um azul, troco pra vinte por favor.” “Peraí que eu vou ali no bar trocar, segura pra mim por favor, que eu já volto.” Eu estava já na minha sétima latinha, com outros três amigos, igualmente bêbados e arruaceiros. Saímos correndo por aí. Atravessamos o bloco, pegamos uma rua à esquerda, outra à direita; alguns foliões nos seguiram. O toco de algodões-doces era um estandarte. Desfilamos em marcha rápida. Alguém, a dado momento, ouviu uma patrulha policial ao longe. Distribuímos os algodões-doces, todos. A mulher chegou, chorosa, com cinco policiais, mas todos comíamos algodões-doces e o toco estava lá, sem qualquer espeto, jogado no meio-fio; não seria mesmo possível reconhecer o ladrão.

O bloco do algodão-doce completou cinco anos no último carnaval; é um dos mais badalados por aqui.

3 comentários:

Anônimo disse...

esse eh 1 dos seus melhores ^^ ..jah tinha lido na comunidade do orkut.. eh sempre um prazer reler uma boa historia ><'

Thiago Borges disse...

Excelente texto cara!
E valeu pelo comentário lá no blog, fico feliz em saber que as pessoas gostam da minha escrita!

Te linkei por lá

Abraços

http://canseidesercult.blogspot.com

Saulo disse...

Noooossenhora!
babay litruz11

Pow, vei, muito bom o texto.
gostei mesmo do seu blog.
Vou te linkar, se quiser pode fazer o mesmo. ;)